Pesquisadores gaúchos tentam desvendar como a cirurgia bariátrica diminui a gravidade da COVID-19 em pacientes com obesidade

O procedimento reduz os receptores que o vírus usa para invadir as células do tecido adiposo

Um estudo coordenado por pesquisadores gaúchos tenta desvendar porque os pacientes que fizeram cirurgia bariátrica têm menor gravidade quando infectados pelo novo coronavírus. Dois estudos internacionais, um francês e um americano, já demonstraram que pacientes que fizeram cirurgia bariátrica no passado tiveram quadros bem menos graves de COVID-19 quando comparados com pessoas com obesidade e que não fizeram a bariátrica, evoluindo com menos casos de internação hospitalar, internação em CTI e menor risco de morte.
A obesidade grave é um dos fatores de risco para desenvolver as formas graves da COVID-19. Além do excesso de peso, as comorbidades associadas à obesidade, como a diabetes, a pressão alta e as doenças cardiovasculares, aumentam as chances destes pacientes evoluírem para internação hospitalar com necessidade de CTI. Como a cirurgia bariátrica reduz significativamente o peso, melhorando ou curando as doenças associadas, estes efeitos devem contribuir para o melhor prognóstico da COVID-19 em quem fez a cirurgia.
No entanto, o coordenador do estudo, o cirurgião bariátrico Guilherme Mazzini, explica que um dos fatores que parece contribuir para um maior risco em pacientes obesos é que o receptor usado pelo vírus para entrar nas células, o chamado ECA-2, está presente em grande quantidade no tecido adiposo. Como o paciente com obesidade tem um grande volume de tecido adiposo, tem também muito mais portas de entrada para o vírus, gerando uma reação mais intensa no organismo. O tecido adiposo também funcionaria como um “reservatório de vírus”, destaca.
A pesquisa foi realizada em colaboração com o Núcleo de Bioinformática do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, e com médicos da Virginia Commonwealth University, nos Estados Unidos. Os pesquisadores estudaram dados de amostras de tecido adiposo de 16 pacientes antes da cirurgia bariátrica e 2 anos após realizarem o Bypass Gástrico. Os dados foram comparados com os de amostras de 16 pessoas com o mesmo peso e percentual de gordura que os pacientes após a cirurgia. Mazzini conta que além de reduzir significativamente o peso e o percentual de gordura, diminuindo o volume de células adiposas expressando ECA-2, a cirurgia diminuiu a expressão genética do receptor usado pelo novo coronavírus. As células adiposas passaram a “fabricar menos ECA-2”, inclusive quando comparadas com as células adiposas das pacientes magras.
O coordenador ressalta que é importante a realização de mais estudos para entender por que a cirurgia bariátrica tem essa ação, e confirmar se ela realmente protege os pacientes. O cirurgião participa ainda de um estudo internacional que demonstrou que as cirurgias bariátricas realizadas durante a pandemia tiveram o mesmo perfil de segurança, desde que obedecidos os cuidados para evitar contaminação. Muitos pacientes que fizeram a cirurgia durante o ano passado provavelmente já correm menos riscos caso se contaminem com o novo vírus. O estudo já foi aprovado pela Obesity Surgery, uma das principais revistas da área, e será publicado nos próximos dias.